Nós aqui do Fallahi estamos vacinadas contra puxas-saco de
plantão.
Para começar, não tem como alguém puxar nosso saco: nós
somos insuportáveis. E grossas. Quem topa ficar aqui conhece nosso jeito de
trabalhar. Lamber nossa bunda só vei ter o efeito contrário.
Quem não gosta do nosso sistema e prefere ser tratada com
mimos, sabe bem pra onde ir.
A história a seguir é verídica, aconteceu há alguns anos.
Ela serve de alerta para todas as professoras de dança que têm uma pessoa assim
em seu grupo.
Um dia ingressa em sua escola uma menina. Assim, como tantas
outras que já passaram pelo seu espaço. Ela se identifica de cara; você, já
saca que ela não é normal. Mas até aí, quem é?
Ela inicia as aulas de dança e em menos de uma semana você
se torna a cobertura do bolo dela: ai, teacher, você é perfeita...ai, teacher,
adoro sua escola... ai, teacher, vocês aqui do Fallahi são a melhor coisa que
me aconteceu... ai, teacher, vocês são as melhores profissionais do mercado...
ai, teacher, eu amo vocês! Impossível não sentir pena dela, a carência é
notória.
Ela, por sua vez muito esperta, aproveita-se de sua piedade e capricha na
verborragia. Ou melhor, na “elogiorragia”. Difícil não se sentir desconfortável. É
tanta lambeção de cu que só de andar a bunda escorrega. E em questão de meses,
já dá quase para cagar as tripas.
Você percebe, então, que toda aula é a mesma ladainha, a
infeliz só falta se jogar debaixo de seus pés para você sapatear sobre ela.
Ainda para piorar, a garota fala pelos cotovelos, te corta no meio de uma
conversa, se faz de sonsa para você se apiedar. Chega a dar vergonha.
O tempo vai passando e seu saco vai ficando cheio, cada vez
mais cheio; você não entende qual é a dessa “uma”. A chatice vai te consumindo.
Os elogios ultrapassam a linha do embaraçoso: é muito claro para você que
aquilo tudo não é verdadeiro. Ela só quer te ganhar. Ela só quer você a ame.
Porque, ao que parece, as pessoas não são capazes de amá-la.
Passa um ano. Você sobreviveu a ela. Afinal, a desgraçada
faz aula particular, você tem que aguentar a bajulação desenfreada téte a téte
com a porra. Além de tudo, você é profissional, precisa ter ética. Não dá para
chegar numa pessoa e dizer que ela é a única aluna entre tantas que você não
consegue ter uma boa convivência porque ela te irrita a ponto de você desejar
se enforcar num pé de salsinha.
Mas chega o momento em que não é mais possível suportar.
Você dá uma indireta, outra e mais outra. Ela não entende. E também não
aprende. Será que um dia o básico egípcio dela vai sair sem que ela tropece nos
próprios pés?
Você se enche. Da puxa-saquice, da aula, dela. Ela não fala
nada que se salve, não entende como andar para frente, quando você desiste de
um movimento para ensinar um mais simples, ela chora. Vá se ferrar, pô! Não sou
paga para ser terapeuta!
As coisas começam a desandar. Você toma uma pinga para
facilitar a digestão, porém, a aula não desce. Ela percebe sua impaciência. Mas
vocês duas tentam. Você, porque ela é sua cliente. E principalmente, um ser
humano. Ela, porque sabe que nenhuma outra trouxa irá aturá-la.
No entanto, quando o negócio já está a beira do precipício,
a filha-da-puta aparece no dia do vencimento da mensalidade e diz que tá sem
grana. Chora. Fala que a vida tá difícil. Coitada.
Você fica fodida. Primeiro, porque contava com essa merreca
que ela já te pagava chorando. Segundo, porque é uma tremenda sacanagem
aguentar uma fulana tapada por tanto tempo para no fim das contas ELA decidir
que não quer mais e sair falando para meio mundo que não estava satisfeita com
o curso e meter a boca em você. Isso tudo depois de ter sugado ao máximo toda a
sua energia a ponto de você rezar para que ela faltasse a cada dia de sua aula.
Terceiro, por ela ter inventado uma desculpinha de merda para pular fora antes
que você desse um pé na bunda dela.
Mas nada como um dia após o outro. Já com a cabeça fria,
você levanta as mãos para o céu. Afinal, finalmente se livrou daquele encosto
maldito. Alunas muito mais bacanas e honestas apareceram depois e o dinheiro
que você acreditou ter perdido com a saída dela quadruplicou com a entrada de
outras.
Passam as estações e sua escola está uma beleza, repleta de
gente que vale a pena. No fundo, você sabe que a fulana vai acabar ingressando
em outra escola, feliz da vida, assim como esteve quando ingressou na sua. O
jargão não sofrerá grandes alterações. “Teacher, você é linda. Teacher, você é
foda. Teacher, você é ensina muito. Teacher, você é diferente de tudo o que eu
já vi a nível de professora”
Você vai rir. Você vai chorar de rir. Você vai sofrer de
rir. Alguma outra pobre coitada vai cair na armadilha dela, assim como você
caiu.
E então,
quando isso acontecer, a você só restará dizer à sua ex-aluna: lambe, minha
filha. Lambe bem. Só que sua futura professora vai se encher mais cedo ou mais
tarde. E chegará o dia em que não vai haver uma alma nesse mundo disposta a
reafirmar sua condição de ser diminuto.
Não. Ninguém merece.
Bjucus